Jurgen Grobler: Um alemão do leste transformou a Inglaterra na maior potência do remo mundial
Em 3 de janeiro de 1991 um fato marcante aconteceu no remo inglês. Nessa data chegava ao país o alemão Jurgen Grobler acompanhado da sua esposa Angela e do seu filho Chris, na época com 10 anos.
Grobler trouxe todos os seus pertences e fazia uma aposta bem arriscada. O cobiçado treinador fazia parte da equipa que montou toda a estrutura que levou a Alemanha Oriental a conseguir muitas medalhas de ouro em todas as olimpíadas de 1972 a 1988.
Aos 45 anos, Grobler queria um novo desafio e decidiu assumir o posto de treinador chefe no Leander Club, que tinha como atleta o lendário Steve Redgrave, na época um “mero” bi-campeão olímpico.
O sorriso de Grobler é contagiante quando ele lembra desse início na Inglaterra.
“Quando cheguei no Leander Club havia alguns barcos, um galpão com muita poeira e alguns pesos. Muita gente dizia que eu fui vitorioso na Alemanha em função do sistema e não da minha capacidade. Eu quis provar a mim mesmo que eu podia vencer em um sistema completamente diferente”.
Com os olhos brilhando ele lembra a primeira vez que chegou em Londres. “Eu amei a cidade logo. Os autocarros vermelhos de dois andares. Era algo tão surreal para mim. Foi paixão à primeira vista”.
Duas décadas depois o caso de amor se acentuou, a ponto dele se considerar hoje um cidadão inglês. Grobler retribuiu essa calorosa receptividade inglesa mantendo a tradição de colocar uma equipa no alto do pódio olímpico nas últimas 10 edições dos jogos.
Depois de conversar um pouco com Grobler qualquer um entende a razão desse currículo impressionante. Ele fala do remo com o entusiasmo de quem está no seu primeiro dia em um novo emprego. Os seus olhos brilham como os de um jovem, apesar dos seus 65 anos. Ele vibra tanto pelos barcos treinados por ele no passado como os atuais. Mesmo que você não seja um fã de remo, após meia-hora de conversa com Grobler você ficará envolvido com todas as estórias contadas por ele.
Os discípulos de Grobler mais bem sucedidos até agora foram Sir Steve Redgrave e Sir Matthew Pinsent, que não escondem os elogios ao talento do técnico alemão.
O maior desafio de Grobler no momento é o dois-sem com Andrew Triggs-Hodge e Pete Reed, que leva no currículo 13 derrotas para a guarnição da Nova Zelândia com Hamish Bond e Eric Murray.
“Grobler é uma grande personalidade”, confirma Pete Reed. “Ele é duro quando tem que ser, e também muito divertido...”
“Steve Redgrave e Matthew Pinsent foram atletas notáveis. Mas os novos atletas são tão importantes quanto eles. Eu quero ter novos heróis. È isso que o nosso desporto precisa. Essa é a mensagem que temos que passar para os nossos jovens. Eles têm que olhar para esses heróis e dizer: Se eles podem, eu também posso. Temos que inspirar essa nova geração”.
Sobre a dupla Redgrave-Pinsent ele acrescenta: “Não há dúvida de que em 1992 e 1996 tínhamos o melhor dois-sem com Redgrave e Pinsent. Porém, em 2000 a situação era bem diferente. Para o público tudo girava em torno de Redgrave mas havia outros talentos que tínhamos que considerar. Steve Redgrave era uma lenda e é claro que todos queríamos que ele ganhase a quinta medalha de ouro olímpica consecutiva mas ele tinha alguns problemas e tínhamos que encontrar alternativas. A pressão que um técnico sofre numa olimpíada é imensa. O próprio Redgrave perguntava-se, se valia a pena tentar mais uma vez o ouro. Eu nunca tive uma atitude protetora em relação ao Redgrave, mas podem ter certeza que ele sempre confiou em mim. A lembrança da vitória do quatro sem em Sydney é maravilhosa! Eu fiquei muito contente!”
Grobler é modesto ao falar do seu papel como técnico: “Se eles vencem o mérito é deles, se eles perdem a derrota é minha. O meu papel principal é motivá-los, principalmente naqueles dias que eles estão muito cansados”
Um papel que Grobler admite não conseguir cumprir bem é o de mensageiro de más notícias para os atletas que não poderão seguir em frente na seleção inglesa. Ele assume o papel e sempre dá a notícia olhando nos olhos dos atletas, mas confessa que já ficou várias noites sem dormir. “A pior coisa do mundo é dizer para um atleta que ele não é bom o suficiente para seguir em frente. Muitos dão o máximo nos treinos e no final eu tenho que pedir desculpas e dizer que infelizmente não dá para seguir em frente. Não é fácil...”
Para 2015, Grobler confirma, sem ironia ou exageros, que o seu objetivo é vencer em todas as categorias de barcos. Ele acrescenta: “Na verdade esse é sempre o meu objetivo...”
Grobler quer ganhar tudo sempre, mas faz questão de ressaltar que essa vitórias serão sempre conquistadas com atletas “limpos”. Grobler conviveu na Alemanha Oriental num sistema onde o uso de doping no remo era comum.
Ele reconhece isso e esse é um assunto que ele não gosta de falar muito pois em 1998, numa investigação realizada na Alemanha sobre o uso de doping na extinta Alemanha Oriental, o seu nome foi mencionado e todas as equipas inglesas sob o seu comando foram colocadas sob suspeita de doping na época.
“Aqui em Inglaterra eu penso nisso todos os dias. Temos 12 candidatos para compor o oito e nunca podemos descartar a hipótese de que alguém irá tentar conseguir uma vaga através do doping. De qualquer forma, possuímos hoje um bom sistema de controle. O skifista Mark Hunter, por exemplo, realizou quatro testes anti-doping em 18 dias”.
Deixando o assunto doping de lado, Grobler está sempre focado em conseguir que os seus atletas estejam no pico no momento certo. “Esse é o pulo do gato e tudo o que fazemos é para alcançarmos esse objetivo. Quatro ou cinco dias antes da prova nós sabemos se as guarnições estão prontas e aí fazemos a sintonia final. A partir daí, cabe aos atletas cumprir o seu papel na regata.